Políticos terão de declarar bens como no IR, diz presidente do TSE
Do UOL Notícias
Em Brasília
O presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Carlos Ayres Britto, anunciou que os políticos que forem candidatos neste ano terão de declarar seus bens da mesma forma que o fazem para o Imposto de Renda. Em entrevista ao colunista do UOL Notícias e da “Folha de S.Paulo” Fernando Rodrigues, Ayres Britto disse que todos os candidatos estarão obrigados a detalhar suas propriedades com a mesma precisão requerida pela Receita Federal, informando os valores.
“Nós estamos aperfeiçoando nosso modelo, aproximando-o do modelo adotado pela Receita Federal (…). Nós estamos fazendo nesses dois campos do formulário de registro de candidatura um reservado para declaração de bens, outro reservado para a vida pregressa processual do candidato; nós estamos introduzindo modificações no sentido do detalhamento”, disse o ministro.
Pelo atual sistema, os políticos podem colocar de maneira genérica, em suas declarações, os bens que possuem. Às vezes nem especificam valores. A regra facilita a ocultação do patrimônio. Com o novo formulário, que será exigido pela Justiça Eleitoral neste ano, esse tipo de subterfúgio não será mais possível.
Outra novidade na eleição deste ano serão as fotos dos candidatos ocultos: quem concorre ao cargo de suplente de senador, vice-governador e vice-presidente.
Em eleições anteriores, só aparecia na tela da urna eletrônica a foto do candidato titular.
Agora, aparecerão também as imagens dos políticos que são eleitos de carona nesse processo –assim o eleitor terá uma chance de ver exatamente quem está escolhendo.
O presidente do TSE reafirmou também que a internet é considerada território livre nas eleições deste ano.
Assim, fica totalmente liberada a realização de entrevistas, debates e discussões entre candidatos já nesta fase de pré-campanha.
“A interpretação que faço, desde a decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) na ADPF 130 [que tratou da Lei de Imprensa], é de que a internet é mesmo um território virtual livre para debates, troca de idéias, informações, entrevistas, aliás, como consta do veto do presidente Lula à Lei 12.034, da minirreforma eleitoral”, disse o ministro.
Campanha antecipada
Neste ano, o TSE aplicou duas multas, no valor total de R$ 15 mil, ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva por campanha antecipada para a pré-candidata do PT à Presidência, a ex-ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff.
Lula passou a desdenhar das decisões da Justiça em eventos públicos.
Indagado sobre o comportamento de Lula, Ayres Britto disse que o bom exemplo deveria partir do presidente.
“A frincha por onde passa um boi, passa uma boiada. Não se pode facilitar, então é preciso que o bom exemplo venha do cargo mais alto para que esse bom exemplo se reflita, se irradie por todos os outros cargos da federação”, disse o presidente do TSE.
Ayres Britto afirmou ainda que a prática é parte da cultura política brasileira.
“O problema é cultural, é histórico, está no imaginário de cada chefe do Poder Executivo federal, estadual, municipal e todos eles chegam como que possuídos dessa obrigação, e ninguém tem essa obrigação, de fazer o seu sucessor; e de preferência ser o sucessor do seu sucessor.
Isso termina confundindo projeto de governo com projeto de poder”, disse o ministro.
Ficha Limpa
Favorável ao projeto de lei que torna inelegíveis candidatos condenados pela Justiça, Ayres Britto disse que, caso o Congresso não aprove o projeto dos fichas limpas, a Justiça Eleitoral estará de mãos atadas para qualquer tipo de iniciativa relacionada ao tema.
“Senão vier a lei, a Justiça Eleitoral estará manietada, porque já houve duas decisões convergentes do TSE e do STF, e eu fiquei entre os votos vencidos, dizendo que a vida pregressa do candidato, ainda que marcada por passivo processual aviltado, não é condição de elegibilidade”, explicou.
Ainda que o projeto não seja aprovado, no entanto, será obrigatório nas eleições deste ano que todos os candidatos apresentem à Justiça Eleitoral ficha criminal contendo todos os processos a que respondem.
As fichas estarão disponíveis na internet para a consulta dos eleitores.
“O candidato é obrigado a entregar uma declaração fidedigna, sob pena de crime de falsidade ideológica, e é bom que o eleitorado saiba da vida pregressa do candidato (...).
Isso é um direito, senão não pode haver voto esclarecido, voto consciente”, disse Ayres Britto.
Financiamento de campanha
Indagado sobre o financiamento de campanhas no Brasil, o ministro reconheceu falhas no sistema atual.
“Nós sabemos que um dos nossos calcanhares de Aquiles, um dos pontos de fragilidade estrutural do sistema político brasileiro é o campo das doações de recursos”, disse.
Britto, no entanto, nega que o financiamento público exclusivo de campanha seja solução para o problema.
“Já pensei que [o financiamento público] seria o ideal, mas há certas lições que a gente aprende não na escola e nos livros, mas na prática (...).
O financiamento exclusivamente público impede as pessoas, a cidadania, e não só as empresas, de participar com os seus recursos financeiros na campanha.
Eu acho que o sistema misto, desde que transparente, ainda é o melhor, me convenci disso”, disse o ministro.
Internet nas eleições
Entusiasta da utilização da internet como instrumento de participação política, Ayres Britto defende que a rede possa, no futuro, reorientar as relações de financiamento de campanha.
“A lógica precisa ser invertida e o TSE tomou a dianteira do processo.
Pela internet neste ano nós vamos viabilizar não só a participação política dos internautas, como a internet enquanto supridora de recursos para campanhas eleitorais.
Os governantes tendem a ajudar quem os ajuda financeiramente, se é a população por inteiro, a cidadania, que vai carrear recursos para os governantes via internet, então eles vão se preocupar mais com a população”, aponta o presidente do TSE.
Arriscando previsão sobre o futuro, o ministro disse acreditar ser possível, um dia, o eleitor, inclusive, votar por meio da internet.
“Rousseau dizia que o futuro nos daria uma condição em que todos decidiriam sobre tudo. Aí vem Norberto Bobbio para completar e dizer que no futuro, com a tecnologia, ninguém precisará sair de casa para votar. Eu tenho que para mim, o futuro nos reserva esse tipo de comodidade, sem perda da segurança de votação. Do jeito que as coisas andam, isso não vai demorar, não. O Brasil é o primeiro país do mundo em tecnologia do voto”, disse.
Indagado sobre se o voto em cédula não seria mais seguro, Ayres Britto negou: “Seria um retrocesso para o Brasil. O voto impresso atrasou demais, é mais oneroso, as impressoras atolavam. É possível fazer auditoria segura eletronicamente”, defendeu o presidente do TSE.
Na entrevista, Ayres Britto manifestou-se também pela manutenção do voto obrigatório no Brasil.
“O voto não obrigatório sempre me seduziu, mas ao entrar aqui [no TSE] fiquei fragilizado dessa convicção. Nós estamos votando mais vezes, cada eleição é um processo em concreto de educação política do povo. Quando alguém não vota tende a se desmobilizar e perder parte da cidadania, e quem geralmente deixa de votar são as classes menos esclarecidas, menos educadas. Não acho que tem ser assim para sempre. É como as cotas, é uma medida educativa para sociedade”, defendeu.
Peluso na presidência do STF
Neste mês o ministro Cesar Peluso toma posse como presidente do STF. Em entrevista recente à Folha de S.Paulo, Peluso disse ser favorável à redução das férias dos juízes de 60 para 30 dias. Ayres Britto foi cauteloso ao tratar do tema, mas disse que o novo presidente está no caminho certo ao tocar no assunto. “Acredito que o futuro sinaliza que deva diminuir para 30 dias mesmo”, disse.
Sobre as expectativas para a gestão de Peluso à frente do STF, Ayres Britto disse que “a Justiça estará em boas mãos com o novo presidente”. “Ele é um juiz de carreira, muito preparado tecnicamente. É mais reservado, mais comedido, mas é um grande magistrado”, disse.
0 Comentários:
Postar um comentário
Assinar Postar comentários [Atom]
<< Página inicial